Completará 65 anos o mais importante documento da era moderna firmado pela quase totalidade dos povos livres, inclusive o Brasil: a declaração universal dos direitos do homem.
Foi a 10 de dezembro de 1948, que se deu o auspicioso evento. Apesar da clareza de seu texto, da meridiana compreensão dos seus princípios, apesar da aura amena que envolve essa carta, ainda impera a discórdia, ainda há escravos neste mundo que se jacta de serem livres, escravos que vivem em cativeiros empregatícios para a satisfação da ganância dos patrões.
A fome grassa por este universo de Deus, uns comem caviar nas mesas de lautos banquetes enquanto outros saciam-se em pequenos animais ardilosamente caçados e raízes arrancadas à unha das entranhas da terra.
Há raptores que matam inocentes por mera vingança política. A justiça se faz, de quando em vez, com bases em provas arrancadas de pessoas violentadas em sua dignidade. Faltam escolas, faltam leitos hospitalares, falta higiene, falta amor. Apesar da Declaração dos Direitos do Homem soar como bálsamo, promessa e aceno de felicidade, há muito infortúnio e incompreensão em todas as áreas da atividade humana. Para expargir um pouco de luz na escuridão reinante, basta que se reflita sobre o artigo primeiro do documento: “Todos os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade”. A obediência a esse preâmbulo bastaria para que o mundo vivesse em sorrisos, sem problemas nem inquietudes. Ah! Carta de Direitos! Se fosse cumprida, não haveria lágrimas a não ser pela perda irreparável e irreversível de um ser amado. Mas seriam lágrimas de saudade e nada mais, nunca causadas pela maldade dos nossos semelhantes.
Como é sublime o que se contém na declaração: “Não há distinção determinada por diferenças de raças, credos, línguas, sexo, cor, religião, política, riqueza ou qualquer outra contradição; toda criatura tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal; em qualquer lugar todos os homens têm direito de serem reconhecidos como criaturas humanas; todos são iguais perante a lei, aforisma que remonta a Becaria, mas sempre olvidado; todos podem obter dos tribunais o remédio para a salvaguarda dos direitos fundamentais; ninguém sofrerá prisão arbitrária, sendo plena a defesa dos acusados; todos têm direito à propriedade, ao trabalho, à livre escolha do emprego com justa remuneração, à educação, à saúde, à habitação. E, o que é fundamental: todo homem tem direito à liberdade de pensamento, consciência, religião, de expressão e de escolher, por escrutínio secreto e direto, os seus governantes, bem como ser escolhido para cargos eletivos.
Sem querer cair em lugar comum, depois da leitura de 30 artigos que compõem a declaração, é o caso de indagarmos, ante as injustiças palpáveis, ante o espetáculo constrangedor oferecido pelas favelas, ante a falta de vagas nas escolas e hospitais para os pobres: o mundo teria, de 1948 para cá, evoluído ou regredido? Reflitamos sobre essa indagação. E sejamos, ao menos com os acontecimentos atuais, mais amigos, mais solidários, mais irmãos. Sem o senso de fraternidade não haverá entendimento entre os homens e persistirmos nesse estado de coisas, é certo, cairemos irremediavelmente no caos.
O mundo está a merecer melhor sorte. Lutemos por ela.
JONIA RANALI